quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Sincericídio

 Quem fala a verdade, não merece castigo. Descobri que esse ditado popular era balela quando uma professora do primário (que porventura sempre pregou esse ditado popular) perguntou quem havia feito algo na sala de aula. Eu, lembrando das palavras dela, prontamente assumi meu erro. E tomei uma chamada de atenção pública que, para mim, na época uma criança empática e sensitiva, fiquei chateado por uma semana.

Mas a lição que aprendi foi importante. Não sou fã ou defensor da mentira. Mas aprendi que dizer a verdade abertamente e sem ter o devido cuidado pode machucar tanto quanto a mentira.

A sinceridade é uma virtude incontestável. Não se pode negar que uma pessoa ardilosa e desprovida de caráter jamais seria alguém com quem desejássemos nos relacionar em qualquer sentido que seja.

Contudo, quem nunca conheceu aquela espécie de pessoa que diz: "eu falo a verdade mesmo, doa a quem doer". E se mostra um ser intragável, que não mede as palavras, que ofende, que humilha, que envergonha os outros. Que expõe pontos de vista como verdades absolutas e inquestionáveis e se vangloria de falar tudo o que pensa e sente, mesmo que isso cause a derrocada de outro ou até mesmo a sua própria.

Falo hoje sobre o sincericídio. Termo relativamente novo, mas que retrata uma ação muito antiga, inclusive Oscar Wilde escreveu: "Pouca sinceridade é uma coisa perigosa, e muita sinceridade é absolutamente fatal".

Não é porque eu sou um ótimo atirador que preciso provar isso atirando aleatoriamente nas pessoas. Não preciso provar minha sinceridade magoando alguém (ou magoando a mim mesmo). Sim, porque posso ser tão sincero que acabo expondo meus defeitos, minhas incapacidades, denegrindo-me e rebaixando-me diante de outros e isso é extremamente prejudicial. Sincericídio é tóxico.

Fundamental ter empatia. Devemos sim, ser verdadeiros ao expressar emoções, opiniões. Mas devemos acima de tudo preocupar-nos com os sentimentos alheios e como nossas "verdades" irão abalá-los.

Ter empatia não é simplesmente pensar: "Se alguém falasse isso para mim, eu não ficaria chateado". Ter empatia é colocar-se no lugar do outro enxergando com os sentimentos dos outros. Poetas e sensitivos não têm dificuldade em fazer isso. As pessoas mais brutas já precisam trabalhar melhor esse aspecto.

No final das contas, o fundamental desta vida são os relacionamentos, tanto os externos quanto o interno. Agir e se relacionar com alguém para que ambos sintam-se bem e felizes. E, sinceramente, danem-se os conceitos pré-moldados e estabelecidos por convenções fugazes e mutáveis. Fazer sorrir é tudo de que o mundo precisa.

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